“Da noite para o dia, colocamos todos os funcionários no home office”. Quem transita no mundo corporativo, já ouviu centenas de vezes essa frase de CEOs e gestores de recursos humanos, sempre orgulhosos com a velocidade com que conseguiram estabelecer o trabalho remoto, no início da pandemia, em março passado. Para algumas empresas, a aparente tranquilidade por terem sistemas online, necessitando somente de um computador e acesso à internet para que os profissionais continuassem a exercer suas funções normalmente de casa, trouxe uma impressão de agilidade na transformação digital, diferente de outros setores que não conseguiram se adaptar rapidamente.
Mas por que esse pensamento não reflete a realidade de muitas organizações? Por que até mesmo empresas que já se auto intitulavam digitais, com acesso a muitas ferramentas tecnológicas, estão enfrentando dificuldades para gerir equipes, se comunicar com o time e atender clientes, passados mais de seis meses dessa nova realidade?
Na visão de Fábio Trierveiler, Lean-Agile Leader na Supero Tecnologia, existe uma confusão no conceito. “Ser ágil não é conseguir entregar mais rápido, mas conseguir se transformar de uma maneira mais veloz. Na virada para o home office a gente pode perceber quais empresas tinham o DNA ágil na sua essência, não só em teoria”, explica.
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Não basta digitalizar a burocracia
“Temos visto muita empresa digitalizando a burocracia, arrastando os problemas que existiam no mundo físico para o mundo digital”, conta Allan Rett Ferreira, coordenador de desenvolvimento da Paschoalotto e especialista em transformação digital. Ele destaca que o momento atual é uma oportunidade de as empresas realmente olharem para os clientes, colocando-os em primeiro lugar e buscando o entendimento para oferecer o melhor serviço na ponta do processo. “Vejo que a digitalização feita por fazer, sem pensar em toda a cadeia e no usuário final, pode até piorar a situação em relação ao que era no mundo físico”.
Para o gerente de projetos na Supero Tecnologia, Leonardo Muller, tornar-se digital é se permitir fazer um exercício de base zero, ver todas as possibilidades para o seu negócio. “Vejo isso muito inserido na cadeia de suprimentos, na qual o consumidor final está cada vez mais próximo do produtor, e essa cadeia tende a achatar ainda mais”, explica.
Luiz C. Parzianello, especialista em Gestão Estratégica e Agilidade de Negócios com 30 anos de experiência em projetos de TI e CEO da SURYA, explica que transformação digital é a junção de transformação cultural com inovação digital, não a simples digitalização, e quem não percebeu isso, está ficando para trás.
Mentalidade deve atingir todos os níveis da empresa
“Não adianta somente os times de desenvolvedores e times de produto terem a mentalidade ágil, se o resto da empresa não tem. O pensamento deve ser comum a toda a empresa”, explica Fábio Trierveiler, Lean-Agile Leader na Supero. Ele ainda destaca que, para essa transformação de fato acontecer, deve vir de cima para baixo, começando pela alta gestão, e que não tem segredo: treinamento e capacitação, para que todos entendam o propósito.
Parzianello, da SURYA, tem um pensamento semelhante: “Eu vejo, às vezes, dentro de uma empresa, a área de negócios se colocando como clientes da área de desenvolvimento. Todos devem entender das metodologias e se colocar como parte da cadeia. Só existe um cliente, que é fora da empresa”. Ele ainda destaca a importância do papel do líder na transformação. “A liderança tem o poder para mudar a gestão, a gestão influencia a cultura. Então para mudar a cultura, primeiro se muda gestão”, diz.
Tenha pessoas de negócios
O especialista Allan Rett Ferreira, da Paschoalotto, destaca que se fala muito no mercado que, para cargos como Product Owner e Product Manager, é preciso ter uma via empreendedora. “Mas existe uma grande dificuldade para se encontrar esses profissionais com uma visão ampla, que entendam de estratégia e negócios”, diz.
“Não se faz business agility sem gente de negócios. O ponto é como formar essas pessoas”, fala Leonardo Muller. Ele destaca que, em sua própria experiência profissional, começou com desenvolvimento de produtos, e depois foi para implantação de negócios. “Durante esse tempo eu tive visão de como funciona o negócio do cliente e pude entender melhor como se conectava na estratégia da empresa, e a trabalhar precificação, como gerar valor”, finaliza.